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Leia bem para escrever melhor

(Foto: Pixabay)
(Foto: Pixabay)

Não fique aí parado com essa cara de quem chupou limão azedo. Não se sinta frustrado, traído perseguido só porque o professor disse que o seu texto não estava bom. Ou, pior ainda, disse que seu texto estava uma m…

Antes de fuzilar o seu professor, saiba que ele leu o seu texto com olhos de um leitor comum. E torceu para que tudo desse certo. Afinal, a melhor coisa do mundo é dar aulas para um gênio em potencial, como é o seu caso. Se ele não gostou foi porque realmente o seu texto estava fraco. E se você for realmente um gênio que está despontando, precisa deixar aflorar a humildade, que é própria dos bons gênios e reconhecer que alguma coisa não está certa e que essa alguma coisa pode ser você.

Uma questão de molho

Seja honesto: quantas vezes você já pegou um jornal ou uma revista para ler uma determinada reportagem e descobriu, logo nas primeiras linhas, tratar-se de um texto absolutamente malfeito, sem sal, sem pimenta, sem chamariz, sem atrativos, uma verdadeira baba? E o que é que você fez? Com certeza desistiu de ler na hora, não foi? Pois saiba que esse é o comportamento normal de tudo quanto é leitor, seja ele quem for. Até mesmo um professor dos menos chatos… Mesmo quando você já tiver se transformado em um jornalista dos mais combativos e afamados, reconhecido em todos os rincões da pátria, deve continuar sendo um simples, um humilde leitor. Claro que com olhares um pouco mais críticos. Hoje, como amanhã, você não vai gostar de ler nem perder o seu tempo com bobagens mal escritas.

O bom da história é que a gente consegue ficar livre dessas bobagens mal escritas nos jornais e nas revistas, logo nas primeiras linhas. Isso acontece todas as vezes em que o autor das literalmente “mal traçadas” linhas não tenha tido a coragem de cumprir com a sua obrigação de fazer um lead bem feito, um lead cativante, um lead curioso, um lead emocionante, um lead que pega o leitor pelos olhos.

Começo revelador

O lead (as primeiras linhas, ou a apresentação da matéria) funciona como o primeiro olhar que a gente dá nos olhos da(o) namorada(o). Ou pega, ou não pega. Ou dá ou não dá. Ou vai ou não vai. Tem que ser um olhar de amor, tem que ser um olhar pidão, tem que ser um olhar de oferta, tem que ser coisa tocante, cativante, entusiasmante, de amante. Porque, se me perdoam a irreverência, escrever é exatamente isso: um orgasmo intelectual. Ou se faz assim ou se desiste de ser um bom jornalista. Na melhor das hipóteses se cai numa vala comum, na mesmice de tantos textos em tantos jornais ou revistas.

Quando o começo do filme é bom geralmente o filme será bom por inteiro. E ele pode ser o mais longo dos filmes, demorar três, quatro horas para acabar que a gente vai ficar assistindo a madrugada inteirinha. Dane-se o dia seguinte, dane-se o despertador. Quando o texto é bom, pode ter até o tamanho da bíblia que a gente lê. Até o professor lê. E gosta.

Quer ganhar uma nota?

Texto bom vale uma nota preta. Na faculdade e principalmente na vida. Texto ruim, sem um bom começo (maldito ou bendito lead) nem o aluno gosta. Nem o aluno lê. Só porque foi ele quem fez, porque foi ele quem apresentou, evidentemente vai fazer cara feia de quem chupou limão azedo quando alguém disser que não gostou. Um ou outro colega poderá até dizer: “não está tão mau assim. Esse professor é que é um chato…”. Pois chato é o colega que fala isso. Porque é chato a gente não ter personalidade e postura suficiente para dizer: “Cara, o texto tá maus mesmo…”. O diabo é que até a gente sabe quanto o texto não está bom. Mas, aí, vem aquele negócio de preguiça (“pô! Escrever tudo isso de novo????? Quarenta e tantas linhas…). Vem o “não tenho tempo para reler…”, e toda e qualquer desculpa esfarrapada do gênero.

Caríssimo, escrever é coisa de amor e amor é amor. Ou se escreve com amor ou não se faz amor e ponto. Escreveu, não leu, o leitor não comeu. Nem o professor…

O que você tem na cabeça?

Repetindo e insistindo: o mundo está cheio de histórias para se contar. E, sendo assim, desde que pense e procure, você nunca terá problemas para localizar uma boa história. Encontrando essa história, esse personagem, já terá meio caminho andado. Só que histórias exigem palavras, muitas palavras. Já dizia um filósofo argentino: “nadie pone nada afora se no tiene nada adentro…”. Traduzindo: ninguém põe nada para fora se não tiver alguma coisa por dentro. Se você não tem uma fartura de palavras na cabeça, se não tiver um bom vocabulário, não vai ser nada na vida jornalística. Razão porque o bom comunicador tem obrigação de ler e ouvir tudo. No mínimo ler e ouvir o máximo.

Lendo, ouvindo, apreciando é assim que a gente aprende as coisas, é assim que a gente adquire vocabulário. Quanto mais palavras você conhecer, mais facilidade você terá para escrever. Sendo assim, ouça, beba tudo o que o seu professor disser. Leia tudo o que ele indicar. Procure ler um jornal por dia. No mínimo um. Leia revistas semanais, ouça muito noticiário de rádio, veja os jornais das televisões. É muito importante isso. Como você já percebeu, jornalista é aquele cara que sabe de tudo, ou pelo menos deveria saber de tudo. E você sempre vai ser cobrado para isso. Fique preparado porque toda hora vão perguntar: “Você soube de tal assunto assim e assado?” Você não tem o direito de ficar com cara de besta com jeito de quem nunca ouviu falar naquilo. Que diabo de jornalista você é? As pessoas acham que a gente sabe de tudo. Logo, a gente tem que saber de tudo para não decepcionar as pessoas.

Nada é perdido na cabeça de um jornalista. O que você aprendeu e não usou hoje, acredite, ainda vai ser usado um dia e poderá salvá-lo num momento de aperto. Na hora que você precisar da palavra ou da expressão mais correta para ser usada em um texto. Então, leia tudo. Todo dia. Toda hora. Leia jornal, revista, gibi, livro de receita, manual de computador e até e especialmente letras de músicas. Aprenda o seguinte: letras de música são excelentes caminhos para proporcionar excelentes associações de idéias. Tudo é detalhe na vida. Até a vida é um detalhe. Uma coisa puxa a outra, um assunto puxa o outro. Você ouve a música e pensa numa porção de outras idéias decorrentes e recorrentes. Como já dizia Lavoisier, “na natureza nada se cria, tudo se transforma”. Nas histórias e nos textos também…

Não seja o bom, seja o melhor

No mundo onde todo mundo diz que ninguém é melhor que ninguém, ganha mais quem se propõe a realmente ser o melhor. E se o seu negócio é o jornalismo, mergulhe fundo naquilo que você gosta. As idéias estão aí, as histórias a serem contadas são infinitas, aplique-se. Dizer que livros, jornais e revistas são caros não são desculpas, uma vez que as bibliotecas estão sempre disponíveis. A internet tem tudo. As emissoras de rádio e TV também. Todos os dias acontecem pelo menos uma dezena de palestras importantes, ministradas por gente que sabe o que está dizendo. E a maior parte delas é gratuita, abordando uma imensidão de temas. São milhares de cursos sobre tudo, disponíveis todos os dias. O jornalista tem que saber de tudo. Tem curso até sobre o melhor aproveitamento da titica da galinha (segundo dizem, um dos adubos mais fortes…). Pois é. E, a propósito, taí uma boa pauta: a importância da titica em geral, particularmente da titica da galinha…

A prova provada

Você não quer ser um gênio? Pois então seja. Escolha a boa história, escreva as primeiras palavras, a primeira linha da sua reportagem como se fosse um poema de amor. Ou, no entanto, seja palhaço e escreva a primeira linha de sua matéria como se fosse uma grande piada. Seja dramático e faça o seu leitor chorar na primeira linha de sua história. Pule, dance, berre, grite, emocione o seu leitor na primeira linha. Dostoiewski já dizia: “o importante é que a emoção prevaleça…”. Todo mundo é emocionável, todo mundo é emoção pura. Até o cachorro é emoção verdadeira quando abana o rabo e ri. Cachorro ri sim, quando abana o rabo… O ser humano, então, chega a se borrar todo em gargalhadas incontidas. Ou inunda lençóis com o seu prato.

Para provocar tudo isso você só precisa fazer um texto emocionante. E começar pelas primeiras palavras desse texto. Pela primeira linha. Para fazer rir ou fazer chorar. Você que escolheu um belo tema, que desenvolveu uma boa pauta, foi curioso o bastante para abranger todos os ângulos que a pauta oferecia, você que pesquisou, você que ouviu, investigou, captou todas as informações possíveis, que obteve material suficiente para escrever um livro, você que checou nomes, cargos, lugares, números de telefones e endereços necessários, você tem todas as declarações possíveis e imagináveis de seus personagens envolvidos na história, você que ouviu todas as partes interessadas, todo mundo que tinha o que falar, agora já está pronto para escrever. Comece pelo começo, fazendo um bom planejamento do seu texto. E encontrando a melhor frase, a melhor expressão, o sumo dos sumos para escrever a primeira linha do seu texto.

Vencendo etapas

Isso mesmo, pegue todas as anotações que você conseguiu ao buscar sua história. Faça uma seleção dos melhores tópicos, dos melhores momentos que a sua reportagem pode ter. O melhor do melhor vai à frente, na primeira linha, como foi dito, depois, na ordem de importância, vá colocando as frases seguintes, formando a tal pirâmide invertida. Coloque todas as informações possíveis em cada enfoque de sua matéria, que é para não ter que voltar ao assunto quando estiver lá na frente do seu texto. Escreva sempre na ordem direta. Procure fazer frases curtas. Evite o aposto (essas coisas só complicam a leitura. Se a informação é tão importante assim, ao invés de colocá-la como aposto use-a em uma frase só para ela. A concordância é fundamental e você sabe disso. A grafia das palavras também. A pontuação, então, é fatal. Vírgulas e pontos dão o ritmo, o sal, a salsa, o molho no texto. O texto tem que ser criativo ao máximo, claro ao extremo e o mais objetivo possível. Tente escrever como você fala. Claro que a comunicação oral é bem diferente da comunicação escrita. No entanto, existem maneiras de se conciliar essa linguagem. Procure fazer isso. Adapte com cuidado e muito carinho. Lembre-se de que quem está lendo, de alguma forma está “conversando” com o texto. É assim que o cérebro da gente processa essas coisas. Escrevendo como você fala, com os devidos cuidados, você estará obtendo certa “musicalidade” nas frases, e essa musicalidade entra no cérebro das pessoas. E elas gostam.

Leia, releia, torne a ler e reler

Dependendo do tipo de texto que você estiver redigindo, evite usar adjetivos. A informação é substantiva, direta. Adjetivar é tomar partido. E o repórter tem que ser isento. Sempre que tiver dúvidas em relação à grafia das palavras não hesite em consultar um dicionário. Aliás, escrever bem e certo é obrigação. Na pior das hipóteses, nas grandes dúvidas, procure sinônimos… Provoque. Instigue.

Desperte a curiosidade do seu leitor. Fuja do lugar-comum. Mexa com a sua sensibilidade, mexa com a sensibilidade das pessoas.

Pegue o leitor na primeira linha, na primeira palavra e vá segurando até o final do texto. Para tanto faça tudo de bom. Inclusive leia e releia várias vezes o seu trabalho com a mais absoluta isenção. Já fez isso? Pois leia e releia de novo. Os erros são malditos e ficam escondidos em cada esquina. Releia. Você sempre vai encontrar um pequeno deslize, uma pequena dúvida uma maneira melhor de enfocar o assunto, uma maneira melhor de formular uma frase.

Se for o caso, comece tudo de novo. O leitor só gosta de textos escritos por quem adorou o texto que escreveu.

Por Professor Edgar de Oliveira Barros

Perfil de Edgar de Oliveira Barros

Edgar de Oliveira Barros

O professor Edgard de Oliveira Barros está há 40 anos no jornalismo, tendo iniciado sua carreira na redação dos Diários e Emissoras Associadas, a maior cadeia de jornais, emissoras de rádio e de televisão que o Brasil já teve.

É bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie, foi repórter de jornais Associados, tendo trabalhado também nas extintas rádio Difusora e TV Tupi. No meio do caminho teve a Propaganda e Edgard trabalhou na MPM Propaganda, para depois fundar a sua própria empresa de publicidade, através da qual ganhou vários prêmios.

Durante 10 anos foi diretor de redação do extinto Diário Popular. Deixando o Diário Popular começou a dar aulas na FACOM/UniFIAM no ano de 1986.

Criou o jornal Imprensa Livre na cidade de Atibaia, com circulação regional. Semanário, o jornal passou a diário tendo inclusive implantado seu próprio parque gráfico com modernas rotativas. Trabalhava no mínimo 18 horas por dia e todos os dias. Cansou.

E faltou dinheiro. Parou o jornal e voltou a dar aulas, sua paixão, na FIAM. Publicou três livros de crônicas e um livro-manual de Jornalismo dedicado aos alunos da escola: Quem? Quando? Como? Onde? O quê? Por quê?.

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