O fenômeno redes sociais iniciou de forma mais significativa no Brasil a partir da popularização daquela que foi a primeira a agrupar milhões de usuários conectados via Web. Escrevi esta matéria no dia em que internautas de Brasil, Índia, Tailândia, Emirados Árabes e Arábia Saudita acessaram o Orkut pela última vez – 30 de setembro de 2014 –, passados dez anos da sua criação.
A partir do Orkut, outras redes sociais apareceram e conquistaram sua parcela de adeptos. Facebook (2004) e Twitter (2006) estão entre as principais. Atualmente, a viralização de logins de um mesmo usuário em diferentes sites de interação online e em aplicativos de comunicação multiplica-se em proporções inéditas. Essa superpopularização desperta a atenção de psicólogos, filósofos, sociólogos, comunicólogos, e professores dos diversos níveis de ensino.
Preocupados com a qualidade e com as implicações decorrentes do uso exagerado das redes como intermediárias das relações humanas – sobretudo as estabelecidas entre jovens –, esses profissionais desenvolvem estudos que rendem resultados com pontos de vista bastante variados.
Renato Nunes, doutor em Filosofia pela UFRJ, reúne reflexões sobre o assunto em artigo publicado na revista Filosofia (ed. 96, 2014), da Editora Escola. No texto intitulado A nova fronteira da incomunicação, ele destaca que “apesar de inúmeras tecnologias comunicacionais disponíveis em nossa civilização técnica, não conseguimos estabelecer, de modo geral, relações comunicativas profundas com nossos interlocutores”.
Outra questão discutida pelo filósofo é o mascaramento da realidade. Para ele, o virtual não reflete o cotidiano. Redes sociais são espaços higienizados: não admitem o feio, o incomum, a reflexão, o trabalhoso, a crítica, o debate consciente. O narcisismo, a perfeição, a felicidade, a bajulação, o bonito, o sucesso e a aceitação são reverenciados, funcionando como padrões a serem seguidos nos ambientes em rede. Fazem parte da regra do jogo – vide Facebook.
Busca-se, em vão, anestesiar a dureza do dia a dia e o tédio por meio de conexões que não promovem engajamentos consistentes; não estimulam a troca de conhecimento; e, segundo o estudioso, “não desenvolvem o senso sadio de suspeita, de dúvida e de crítica no ato de compartilhar conteúdos”.
A jornalista e escritora Martha Medeiros é de opinião diferente. Em entrevista concedida ao programa Roda Viva, da TV Cultura – 01 de setembro de 2014 –, ela compara as redes sociais ao ato de receber convidados em casa. “Servimos o melhor prato; conversamos assuntos agradáveis; vestimos roupa nova; cuidamos da aparência; gastamos simpatia. O que há de mal nisso?”.
Medeiros diz que os ambientes de interação on-line não têm obrigação de reproduzir a vida tal como ela é no seu desenrolar diário – o que não significa negar suas dificuldades, tristezas e crises. “Não é pecado exaltar o que você tem de melhor na Internet. Eu até acho compreensível. As pessoas estão ali se recepcionando. De fato, às vezes dá a impressão de que a vida é só isso. Mas a realidade não é muito diferente. De vez em quando, disfarçamos situações. Para mim, trata-se de um reflexo da vida real. Se me exponho, prefiro mostrar o que tenho de bom. Não gosto que me vejam chorando. A gente não fica alugando os outros falando dos nossos problemas, a não ser com os mais íntimos, com minha melhor amiga, por exemplo. Mas não escancaro. A Internet escancara tudo. Expõe-se quem quer e como quer”.
Usando as palavras de Nunes, “o grande problema que envolve as relações humanas na era da virtualização das comunicações não consiste de modo algum nas próprias inovações tecnológicas, mas em seu uso inadequado”. Ou seja, demonizar a tecnologia não soluciona a questão. Se existe algum elemento que mereça atenção no processo comunicativo, é o emissor-receptor da mensagem; quer dizer, o ser humano, não o veículo.
Por Felipe Melo
Perfil do Autor
Felipe Melo tem 23 anos. Atualmente, cursa o 5º período de Jornalismo no Centro Universitário de Patos de Minas (Unipam). Depois da sua casa, a biblioteca é o lugar mais frequentado por ele. Pretende trabalhar na área de Jornalismo Cultural, com ênfase no segmento literário. Tem a Filosofia como hobby.